quarta-feira, 4 de novembro de 2020

Sinhozinho e a maldição da cobra grande - Bonito - MS

Todo lugar tem suas lendas, suas histórias secretas ou pouco conhecidas. Sabendo disso, sempre que possível, pedimos aos moradores de cada lugar que visitamos que nos contem algum causo - de preferência fantástico! - típico da região. Algo que traduza um pouco do imaginário da localidade.

Em Bonito é claro que não podia ser diferente. Depois de jogar alguma conversa fora com o pessoal do hotel ficamos sabendo pela Thayná, a atendente da agência de turismo que fica no saguão, da existência de um mito que assombra a cidade desde a década de 40: a maldição da cobra do Sinhozinho.

Claro que decidimos investigar o caso pesquisando um pouco mais e para isso fomos em busca de uma capela dedicada a sua memória, localizada na zona rural do município. De posse de um mapa rudimentar e das indicações da Thayná, saímos a levantar poeira pelas estradas rurais de Bonito.

Senta que lá vem a história

Pelo que pudemos apurar em entrevistas com alguns moradores, além do que foi possível encontrar na web, concluímos que Sinhozinho era um homem misterioso - tido como santo - que realizava curas pela região lá pelos idos da década de 40 do século passado.

Sua aparência chamava a atenção por ser muito diferente dos habitantes locais. Tinha pele clara, olhos azuis, barba e longos cabelos loiros. Segundo alguns, ele provavelmente teria vindo do sul do Brasil, o que explicaria sua aparência. Além disso, vestia um manto que cobria seu braço esquerdo, o qual permaneceu sempre oculto por razões desconhecidas.


Banner com representação do Sinhozinho e sua cruz

 

Estandartes utilizados em procissões

Sinhozinho não falava. Para se expressar utilizava gestos, frequentemente apontando para o Céu. Sua alimentação era basicamente frutas, legumes e verduras que colhia junto à natureza, uma vez que não aceitava donativos. Também fazia largo uso de mel, que sempre trazia consigo em uma cabaça. Dizem que possuía o dom da cura, utilizando para isso nada mais que água e cinzas. 

Ele também tinha por hábito erguer cruzes de madeira por onde passava, sendo que três dessas cruzes acabaram por possuir um significado muito especial.

Aos poucos essa figura marcante foi conquistando a simpatia do povo simples de Bonito e chamando a atenção dos poderosos locais, que passaram a considerá-lo uma ameaça.

Para resolver o problema, as autoridades resolveram prender Sinhozinho e se livrar dele em definitivo. Foi então que a polícia o capturou e levou num carro de bois, após espanca-lo. A partir desse ponto da história as versões divergem um pouco. Alguns dizem que ele foi assassinado e esquartejado, enquanto outros preferem acreditar que ele simplesmente foi expulso e nunca mais voltou.

Seja como for, há um ponto em que todos concordam: reza a lenda que antes de sumir (ou de sumirem com ele), Sinhozinho teria aprisionado uma enorme cobra numa pedra, dentro de uma montanha - possivelmente uma sucuri, já que elas são comuns nos rios da região - e lançado  uma terrível maldição: quando a última de três cruzes por ele erguidas cair, essa enorme cobra se libertará de seu cativeiro e sairá da caverna para destruir Bonito e devorar seus habitantes.

Alguns interpretam essa profecia como um alerta contra a ganância que destrói o meio-ambiente em busca de lucro, mas para a maioria trata-se de uma espécie de vingança contra a injustiça contra ele cometida.


Capela do Sinhozinho

Altar no interior da capela


A medida extrema empregada pelas autoridades na verdade teve um efeito contrário ao fazer nascer a lenda que vive até hoje nos corações e mentes dos moradores de Bonito. 

Prova disso é que no interior de uma fazenda foi erigida uma capela muito simples, dedicada à Nossa Senhora de Aparecida, mas conhecida por todos como a Capela Do Sinhozinho. Todo ano, no dia 12 de Outubro, ocorre uma grande peregrinação de fiéis que vem à capela agradecer e pedir graças a essa figura que permanece em silêncio, mas secretamente vela pelos desvalidos de Bonito.

A fama desse homem singular é tamanha que extrapola as fronteiras brasileiras. Em 2016, o fotógrafo taiwanês Eric Cheng veio ao Brasil para gravar um episódio da série Tales By Light sobre a sucuri-verde no rio Formoso, em Bonito. Durante as filmagens, ele ficou sabendo da história e decidiu incluí-la no documentário, levando ao mundo a Lenda do Sinhozinho. 


A última cruz ainda está de pé. Mas até quando?

É interessante salientar que as pessoas com quem falamos disseram não levar a sério a ameaça da tal  cobra, mesmo sabendo que já caíram duas das três cruzes. Entretanto ... Quando chegamos na Capela constatamos que a cruz remanescente encontra-se escorada e protegida contra possíveis acidentes que a deitem por terra. Pelo sim, pelo não é melhor não arriscar.


Como Chegar

  • Saindo de Bonito pela rua 29 de Maio, pegar a MS 345 rumo ao Distrito Águas de Miranda;
  • Após a segunda ponte, dobrar à esquerda (é logo em seguida);
  • Dobrar à direita no cemitério (é preciso abrir uma porteira);
  • 3 porteiras depois chega-se na capela, que fica à direita, dentro de um cercado;
  • A capela é extremamente simples e dedicada à N. S. de Aparecida;
  • Saímos do hotel às 09:00 e voltamos às 11:30.


Fontes Consultadas


Tales by light. Netflix. https://www.netflix.com/br/title/80133187. Acesso em 03/nov./2020.

Sinhozinho. Portal Bonito.  http://www.portalbonito.com.br/cultura/folclore/sinhozinho . Acesso em 28/out./2020.

Sinhozinho, a lenda que explica bonito. Bonito incomparável. https://bonito-in.com/2020/08/01/sinhozinho-a-lenda-que-explica-bonito/. Acesso em 03/nov.2020.

quarta-feira, 14 de outubro de 2020

Gastando Sola em Bonito - MS

A pandemia não acabou e nem a nossa vontade de viajar! Por isso, tomando todos os cuidados, calçamos as botinas e fomos até Bonito, no Matro Grosso do Sul, sacudir o pó acumulado durante a quarentena.

Paulo e Renata no Buraco das Araras
Paulo e Renata no Buraco das Araras

Foi uma viagem e tanto, que nos permitiu conhecer um lugar maravilhoso e pessoas bacanas, as quais nos deram dicas super legais de passeios. Inclusive de um que não está nos roteiros tradicionais, mas que adoramos e sobre o qual faremos um post. Aguarde.

Enquanto preparamos as fotos e as matérias sobre Bonito, deixo aqui uma dica quente para quem deseja turistar por lá:

- alugue um carro!

É isso mesmo. O transporte turístico é monopólio de uma empresa local que cobra um absurdo pelo transporte para os atrativos. Houve um caso em que o custo do deslocamento era maior que o ingresso no atrativo.

Há duas locadoras de carros em Bonito: a Unidas e a Localiza. Optamos pela Unidas, que nos atendeu muito bem e ofereceu um custo de locação bem mais em conta do que gastaríamos utilizando o transporte monopolizado.

Rodamos com o carro locado por quatro dias e pagamos R$ 549,54 (uma suv com câmbio automático e ar condicionado).

Considerando os passeios pagos que fizemos, o equivalente usando o transporte da operadora, seria de R$ 660,00.

Entretanto, é importante ressaltar que de posse do carro conseguimos realizar passeios por conta própria com total liberdade de horário, o que seria impossível de outra forma.

E considerando a situação atual da pandemia, evitar o uso de vans lotadas é um plus que não pode ser negligenciado!



quinta-feira, 23 de julho de 2020

Cadê meu kit?! Mais um causo de viagem - Cavalcante - GO

Te aprochega vivente! Enquanto essa tal de pandemia não se aquieta, vou te contar mais um causo de viagem desse gaúcho que mora no Rio e resolveu gastar sola na Chapada dos Veadeiros lá pelos idos de 2018.

Antes de começar a história, esclareço que perrengue só é ruim na hora em que acontece. Na verdade eles são o tempero que dá sabor à aventura. São deles que nos recordamos - e rimos - nas conversas entre amigos e são eles que mantém viva a memória dos personagens envolvidos. Não é mesmo?

E por fim, preciso informar aos que não me conhecem que ando sempre com um kit de sobrevivência na mochila e que o mesmo não é fraco não! Já salvou a mim e meus companheiros de muita enroscada, tanto em trilhas quanto no asfalto. Enfim, vamos aos fatos.

O causo da Cachoeira Rei do Prata

Os detalhes dessa trilha - verdadeiramente sensacional - estão disponíveis no artigo Trilha da Cachoeira Rei do Prata, aqui mesmo no blog, que contém informações importantes para quem deseja se aventurar por aquelas bandas. Agora o foco é o que aconteceu depois de termos realizado a trilha.

Naquele dia saímos bem cedo da pousada para percorrer um trecho de aproximadamente 60 km em estrada de chão batido, que nos levou ao ponto inicial da caminhada. Quem costuma viajar pelo interior sabe que essas picadas cobertas de costeletas acabam com qualquer veículo, por mais forte que seja, e o nosso já estava pra lá de Bagdá. 

A estrada e os veículos que protagonizaram esse causo
Os protagonistas desse causo.

Na ida foi tudo bem. Depois de aproveitarmos o dia em meio a natureza fantástica do lugar foi chegado o momento de retornar aos carros, que nos levariam a um restaurante para encerrarmos a noite.

Chegamos no estacionamento por volta das 18:30. Como eu estava na turma da frente fui o primeiro a chegar e depositar minha mochila no porta malas do carro. E, assim como eu, os demais membros da expedição foram chegando e colocando suas mochilas sobre a minha.

Foi aí que se deu a origem desse causo ...

Grupo completo, carga carregada, todos acomodados em seus respectivos assentos, hora de partir. Haviam dois carros e o primeiro saiu lépido e fagueiro. Sentado ao lado do motorista vi quando ele tentou dar a partida repetidas vezes sem sucesso. Fiquei na minha, imaginando que fosse manha de carro velho. Ledo engano! Lá pelas tantas o rapaz puxou o rádio e tentou contato com a primeira viatura:

- Fulano, na escuta? Pane elétrica no carro. Solicito ajuda.

- ...

E nada. Silêncio absoluto. O outro veículo já estava fora de alcance devido a topografia acidentada da região que bloqueava o sinal de rádio.

Aí teve início um princípio de confusão com todos descendo do carro, dando palpites, querendo ajudar e - essa é que era a verdade, loucos para saírem daquele fim de mundo.

- Fulano, me vê uma chave de fenda - ouvi o motorista dizer ao guia.

- Tá pedindo pra mim? respondeu ele e emendou: não tem no carro?

Na verdade tinha. No meu kit de emergência. Soterrado por não sei quantas mochilas e com o porta-malas trancado. 

E não era só isso. A noite começou a cair e com ela veio o frio. Era junho e lá é clima de deserto. Calor durante o dia e baixas temperaturas a noite.

Em resumo, sentíamos uma mistura de frio, fome, cansaço e frustração por não conseguir fazer aquele maldito motor funcionar.

E no meu caso particular, a frustração era dupla porque tudo que eu precisava naquele momento estava inacessível.

Depois de um tempo, que pareceu uma eternidade, chegou o primeiro carro de volta, vazio. O responsável pela excursão havia estranhado a demora e o mandara de volta adivinhando algum perrengue no caminho.

Após algumas várias tentativas, finalmente conseguiram fazer o carro pegar na base da chupeta. Por pouco não esgotaram a bateria do primeiro carro, nos condenando, talvez, a passar a noite ali.

Resumo da história: chegamos ao restaurante por volta das 21:00 horas, varados de fome! E foi assim que eu aprendi a não me separar da minha mochila sob hipótese alguma. Pelo menos também foi assim que eu pude apreciar o estrelado céu noturno do Cerrado. Acreditem, é uma visão memorável e inesquecível.

Para saber mais sobre segurança na trilha leia o artigo Gastando sola com segurança - guia básico de sobrevivência para iniciantes.

Sobre o kit

O conteúdo do kit varia em função de vários fatores, tais como o local da trilha, estação do ano, tempo de duração da empreitada, infraestrutura disponível no destino, entre outros. Entretanto, há um pequeno grupo de itens que não podem faltar e que já provaram sua utilidade em muitas ocasiões - que teriam sido bem piores se eles não estivessem comigo naquele momento.


Kit básico de sobrevivência
Núcleo duro do meu kit de sobrevivência.


A base do kit é a seguinte:
  • hidratação: cantil e purificador de água;
  • iluminação: lanterna de cabeça e de facho;
  • fogo: isqueiro e iscas para acelerar a combustão;
  • orientação: bússola;
  • cutelaria: canivete de resgate;
  • ferramentas: alicate multifuncional;
  • cordame: dois rolos com 6 m de paracord e uma pulseira do mesmo material com bússola e pederneira;
  • fixação: dois prendedores.
Além desses itens, costumo levar um kit de primeiros socorros, poncho descartável, rações de emergência e mais algumas cositas que podem ser úteis.

E antes que alguém pergunte:
  • isqueiro dá de dez a zero em pederneira, não pesa e ocupa pouquíssimo espaço. Na hora do aperto é fogo rápido e garantido;
  • porque prendedores? Pois é. Essa foi uma das coisas que a experiência me ensinou. São um recurso valioso no meio do nada. Servem até pra segurar a roupa no varal. 
Seja como for, monte o seu conjunto e não saia de casa sem ele. O tempo e os perrengues vão se encarregar de mostrar o que é essencial e o que é acessório em caso de necessidade!!




segunda-feira, 22 de junho de 2020

Causos de viagem - perdido em Curitiba - PR

Enquanto a pandemia não deixa a gente sair de casa, o jeito é ir revivendo antigas histórias de viagem para não perder o jeito e não deixar cair no esquecimento - afinal são tantas aventuras que lá pelas tantas o cérebro se confunde ...

Essa aconteceu num passado distante, quando eu trabalhava numa empresa de automação de acervos bibliográficos (sim, isso existe) e viajava pelo Brasil demonstrando o produto, dando cursos, fazendo manutenção e suporte, essas coisas típicas daquela profissão.

Nesta ocasião a empresa onde trabalhava, agendou uma série de visitas que começava na Bahia e ia descendo até chegar em Curitiba, passando por umas três ou quatro outras cidades no meio do caminho. Algumas visitas eram rápidas, outras levavam alguns dias, de modo que eu trocava de hotel com relativa frequência. E foi aí que se deu o problema.

Quando cheguei em Curitiba estava exausto e faminto. Fui direto ao hotel e, lá chegando, fui informado que meu quarto ainda não estava arrumado. O atendente perguntou se eu não preferia dar uma volta - era domingo - em vez de ficar esperando no saguão. Aceitei a ideia e fui direto para a Boca Maldita em busca de um mata-fome qualquer. Entretanto ...

Eis a Boca Maldita

Eu havia passado vários dias na cidade anterior e, chegando no aeroporto, fora direto para o hotel de forma automática - movido pelo hábito. Só  na hora de voltar é que me apercebi que não lembrava o nome do hotel atual, apenas o da semana anterior!!

Fiquei zigue-zagueando pelas calçadas, olhando vitrines sem enxergar, até que uma vaga sugestão de nome se formou em minha mente. De posse desse vislumbre fui até um taxista e larguei direto:

- o senhor sabe se existe um hotel chamado ... aqui em Curitiba?
- com esse nome não, mas tem um parecido - respondeu ele;
- é pra lá que a gente vai então - disse eu.

Claro que no caminho expliquei ao motorista o quê havia acontecido. Ele achou muita graça e disse que eu ficasse tranquilo. Caso esse não fosse o hotel certo, ele conhecia praticamente todos os hotéis da cidade e iríamos de um em um até encontrar!

Felizmente acertamos na primeira. Confesso que suspirei aliviado e, desde então, sempre que me hospedo onde quer que seja, pego um cartãozinho com o nome e endereço do local e coloco na carteira.


quarta-feira, 9 de outubro de 2019

A moça, o cuy e o turista, um causo em Cartagena - Colômbia

Colorida e misteriosa, Cartagena reserva muitas surpresas aos seus visitantes

Estamos de volta da ensolarada e colorida Cartagena de Índias, onde passamos momentos maravilhosos e pudemos desfrutar das belezas da terra, bem como da hospitalidade dos cartageneses.

Essa foi uma viagem um pouco diferente, onde não faltaram ação, emoção e reviravoltas surpreendentes que serão oportunamente contadas, lógico! Entretanto, para abrir os trabalhos vou contar uma estória que parece mais uma anedota, mas que aconteceu e da qual tenho até testemunhas. Vamos aos fatos:

A moça e o cuy


No dia em que chegamos a Cartagena, após uma longa noite apertados na classe turística, largamos nossas coisas no hotel e fomos esticar as pernas, percorrendo os arredores em busca de um primeiro contato com os habitantes locais. Depois de caminhar um bom pedaço chegamos à famosa Plaza de Los Coches, aquela onde está localizado um dos cartões postais da cidade, a famosa Torre do Relógio.

Nessa praça, do lado oposto ao do relógio, há um antigo prédio com arcos onde se encontram alguns restaurantes, sendo que um deles é especializado em comida peruana. Como de hábito em diversos lugares, mas particularmente verdadeiro em Cartagena, há sempre uma pessoa na porta do estabelecimento convidando os passantes a entrar - em bom português, alguém que fica catando clientes para a casa. Nesse caso, quem estava de prontidão era uma jovem com não mais de vinte anos, paramentada com uma roupa típica de alguma cultura ainda não identificada.

Também é preciso dizer que tive o privilégio de conhecer bem o Peru, em mais de uma ocasião, e que sou fã incondicional da gastronomia peruana. Por isso fui ter uma palavra com a mocinha para saber detalhes do cardápio. Muito atenciosa ela ia recitando seu texto decorado quando a interrompi, movido pela lembrança de um prato que havia provado em terras peruanas:

- vocês servem cuy?

A interrupção aturdiu um pouco a menina, que ficou sem saber o que responder. Culpa minha que atrapalhei a programação padrão do discurso dela, tadinha. Rapidamente se recompôs e disse que iria lá dentro perguntar se o restaurante servia o tal do cuy.

Num pulo estava de volta, o rosto vermelho, com uma expressão mista de nojo e horror:

- Cuy é um rato, não servimos isso aqui. Esse é um restaurante de comida peruana!

A bem da verdade, cuy é um porquinho da índia, sendo uma valiosa fonte de proteína desde o tempo dos Incas!!

- Senhorita, disse assim que ela se calou, o cuy é um dos principais pratos da gastronomia peruana. Não entendo porque não o servem aqui.

Depois dessa achei que seria melhor continuar em frente. Ao fazer um rápido cumprimento de despedida percebi que um dos atendentes tinha vindo junto com ela e demonstrava muito animação. Desconfio que alguém pregou uma peça na pobrezinha.

Seguimos nosso caminho e acabamos por descobrir um prato local nada típico, mas muito original e saboroso: o burguerpizza. Mas isto já é uma outra estória ...

sexta-feira, 12 de julho de 2019

Três Ilhas e a Igreja de Pedra - Belmiro Braga - MG

Já há algum tempo ouvíamos falar da Igreja de Pedra de Três Ilhas, mas, por um motivo ou outro, não surgia oportunidade de irmos até lá para conhecê-la ao vivo e a cores.

Até que um dia ...

Era junho de 2019 - feriado prolongado devido a Corpus Christi - e na última hora resolvemos dar uma volta em Rio das Flores onde, mais uma vez, alguém comentou sobre a localidade de Três Ilhas. Foi um dos hóspedes da pousada onde estávamos que estava retornando de lá e deu as orientações de como chegar. Na verdade foi muito fácil, pois bastou seguir pela RJ-151 até a Ponte Três Ilhas, dobrar a esquerda na saída da ponte, já em Minas, para pegar a Estrada São José das Três Ilhas no rumo certo e seguir em frente até chegar em Três Ilhas propriamente dito. A estrada é de chão batido, mas estava muito bem conservada. Melhor até que o trecho de asfalto que pegamos na volta, já no Estado do Rio de Janeiro.

Seguimos pela estradinha de terra acompanhados pela paisagem rural, com esparsas casas de fazenda, até encontrarmos um calçamento de pedras irregulares, sinal que havíamos chegado. Confesso que fiquei surpreso. Três Ilhas é basicamente essa única rua calçada, cortada por algumas transversais, praticamente perdida no meio do nada. E esquecida pelo tempo.

Logo na entrada avistamos o primeiro dos Passos espalhados em torno da Igreja de Pedra. Passos são capelas destinadas a guardar as etapas da Via Crucis, que reproduzem a caminhada de Jesus Cristo até o Calvário. Daí seu nome.

Acostumado a ter que esperar que os turistas deem uma folga na hora de registrar pontos de interesse em outros lugares, estranhei um pouco o fato de ninguém estar se atravessando na minha frente! Ou seja, Três Ilhas ainda é um lugar que se pode visitar com calma, pois o turismo de massa, pelo menos até o momento, não demonstrou interesse por ela.

Fachada da Igreja de Pedra

A tão falada Igreja de Pedra é, literalmente, o ponto culminante da vila - uma vez que está no alto de uma colina e é praticamente impossível não enxergá-la de onde quer que se esteja. Estacionamos o carro e fomos dar uma olhada. Nesse dia ela estava aberta, mas nem sempre é assim. Caso esteja fechada basta procurar o Edinho, guardião da chave e dono da Pousada São José, a única disponível nos arredores. E é também onde fica o único restaurante - descobrimos isso na hora do almoço.


Interior da igreja

Anjo que decora o jardim em frente à igreja

Três Ilhas é um daqueles lugares que mesmo estando lá a gente se pergunta se realmente existe. Aliás fico me perguntando se ele permanecerá assim por muito tempo. Se você gosta de lugares autênticos, onde tudo permanece do mesmo jeito pela inércia e quer ter uma experiência única vá conhecer Três Ilhas agora, antes que os ponteiros do relógio a encontrem e a forcem a se mover em direção ao futuro.

Veja mais imagens da nossa visita a Três Ilhas no álbum do Facebook  e no nosso perfil no Instagram.

Casario da rua principal

Antiga residência de um dos barões do café

Um dos Passos, próximo à Igreja de Pedra

Para saber mais sobre a história de Três Ilhas, viste a página do IEPHA - Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais sobre o Centro Histórico de São José das Três Ilhas.


terça-feira, 2 de julho de 2019

Rio das Flores - RJ

Era o feriadão de Corpus Christi e não havíamos feito planos de sair, só que lá pelas tantas bateu aquela vontade de dar uma voltinha e foi aquele tal de "mas pra onde?", "será que tem vaga?" e o principal "mas o quê tem pra fazer lá?"!!

Foi assim que de uma hora para outra estávamos na estrada rumo a Rio das Flores. Não sei se essa escolha se deu por acaso ou obra divina, mas não podia ter sido melhor.

Saímos numa sexta bem cedinho da cidade do Rio de Janeiro e optamos por utilizar a BR-116. A estrada está em boas condições e paga-se apenas um pedágio (R$ 15,20), entretanto ao passar por Barra do Piraí é necessário entrar na cidade e acabamos por ficar presos num engarrafamento que nos tomou um bom tempo.

Ao final da viagem decidimos visitar a localidade de Três Ilhas em Minas Gerais e, por isso, para retornar ao Rio tomamos a RJ-040. A estrada está em condições sofríveis em vários pontos, com buracos e irregularidades na pista. Além disso, nesse trajeto passamos por dois pedágios (R$ 11,60 cada).

Um pouco de história


De acordo com o site da Prefeitura de Rio das Flores o povoamento da região intensificou-se devido ao ciclo do café - existem em torno de 40 fazendas históricas no entorno! Em 1851 foi erigida a capela dedicada a Santa Teresa, instituindo a Freguesia de Santa Teresa de Valença, então distrito de Marquês de Valença. A prosperidade adquirida com o cultivo do café foi decisiva para o desenvolvimento do povoado. Em 1882 foi inaugurada a estação da Estrada de Ferro Rio das Flores, e em 1890, emancipou-se do município de Valença, tornando-se Vila de Santa Teresa. Devido à Lei Áurea e à crise econômica do primeiro ciclo cafeicultor, a cidade foi entrando em declínio, sofrendo acentuado êxodo e gradual câmbio do foco produtor para o setor pastoril. Em 1929, a vila foi elevada à condição de cidade, e em 1943 passou a se chamar cidade de Rio das Flores. Atualmente tem sua economia baseada na agropecuária e no turismo.

Mas porque Rio das Flores? De acordo com a Sra. Margareth, proprietária da pousada Vila Flor, onde ficamos hospedados, até o início do século passado as margens do rio eram cobertas por Lírios do Campo, criando uma paisagem realmente encantadora. Infelizmente, hoje essa caraterística se perdeu e ficou apenas a referência no nome da cidade.

Dando umas voltinhas


Uma vez instalados na pousada e com algum tempo de sobra antes do almoço,  saímos para conhecer o centro de Rio das Flores, que, embora não seja muito grande, reúne tudo do que se precisa ao alcance de alguns poucos passos. Chamou nossa atenção o aspecto geral de organização e limpeza da cidade. Para quem como nós está acostumados a conviver com o caos diário do Rio de Janeiro, poder desfrutar dessa sensação de tranquilidade é um grande privilégio.

O primeiro ponto de parada foi a igreja matriz, dedicada à Santa Teresa D´Ávila. Aqui foram batizados Santos Dumont e sua irmã. Infelizmente estava fechada e só pudemos observá-la por fora.

Igreja Matriz de Rio das Flores.

Em compensação, atrás dela havia outro local que aproveitamos para conhecer: o Cemitério!

Cemitério de Rio das Flores - aqui repousam os restos dos antigos barões da região.

Tendo em vista o poderio econômico dos barões durante a época áurea do café era de se esperar que houvessem belos exemplares de arte tumular. Infelizmente encontramos bem poucos e um tanto deteriorados.

Veja mais imagens de nossa visita à Rio das Flores no álbum do Facebook e no nosso perfil no Instagram.

Hora do almoço


Chegamos próximo da hora do almoço já sabendo que a partir das 12:30h a Fazenda Santo Inácio abre seus portões para receber os visitantes com uma comidinha caseira feita com produtos da região num fogão a lenha.

Fomos recebidos pelo Sr. Celso, dono da fazenda e por sua filha Ana Célia - que é quem faz as honras da casa. Logo logo o papo estava engatado e aproveitamos para conhecer um pouco da história do lugar. Ao final, combinamos até um churrasco de costela na vala, a ser providenciado na nossa próxima visita.

D. Cida e a vaca atolada - entre outros pratos.

Sede da Fazenda Santo Inácio.

Um dos moradores de quatro patas da fazenda.

O valor é de R$ 45,00 por pessoa, sendo que o vivente pode fartar-se a vontade! Cada um pega o seu prato e vai até a cozinha, numa informalidade gostosa que torna a experiência ainda mais gratificante.

As cozinheiras são Cida e Regina e neste dia elas prepararam uma vaca atolada que estava uma delícia. Eu mesmo devo ter desatolado umas duas ... Também tinha arroz, feijão, angu, purê de abóbora, leitão assado, quiabo, espinafre, macarrão, saladas diversas e sobremesas. Isso sem contar o cafezinho.

Também é preciso dizer que o doce de mamão e o queijo de minas ganharam o coração da D. Renata, nossa especialista em questões culinárias.

Depois de saciada a fome, hora de dar umas voltas pelo terreiro para fazer a digestão e desfrutar da tranquilidade do campo e, obviamente, tirar fotos da bicharada que anda solta pelo quintal.

Depois do almoço na fazenda, pegamos o carro e seguimos em busca de outra especialidade da roça: a cachaça. Seguindo as orientações do Sr. Celso nos dirigimos ao Alambique Vieira  & Castro, o qual é bem fácil de encontrar por encontrar-se numa das glebas da Fazenda União.

Sra. Aline e D. Renata conferindo a origem da letra da música "pinga ni mim".

Fomos recebidos pela Sra. Aline, uma das proprietárias do alambique e especialista de primeira quando o assunto é água que passarinho não bebe. Segundo ela, a empresa tem uma preocupação muito grande com a sustentabilidade e o controle de qualidade no processo de fabricação da cachaça. Tudo começa com o cultivo próprio da cana na propriedade. A partir da colheita, todo subproduto é aproveitado de uma forma ou de outra de modo a causar o menor impacto possível no meio ambiente.

Mostrador de um dos tanques de destilação.

Como a visita foi feita na época da entre-safra os equipamentos estavam desligados para manutenção. Felizmente havia estoque suficiente da mercadoria e pudemos trazer alguns litros de recordações etílicas dessa viagem...

Hora da janta


A cidade conta com uma boa infraestrutura de bares e restaurantes, só que naquela noite haveria um show e as casas não estavam servindo refeições - não me perguntem o que uma coisa tem a ver com a outra! Então perguntamos a um dos rapazes se haveria alguma outra opção e nos indicaram o Restaurante da Paulinha. Como ali tudo é perto fomos andando até encontrar uma casa simples, com mesinhas na calçada e onde foi servida a pizza mais bem recheada que experimentei até hoje. Também servem pastéis, petiscos e lanches - entre outras coisas. Ao olhar o cardápio chamou nossa atenção a pizza sabor X-Tudo. Para garantir pedimos meio-a-meio com portuguesa. Tenham a certeza de que o produto faz jus ao nome, pois realmente veio de tudo e mais um pouco naquela pizza!!

Também foi legal passar um tempo ali porque é um ponto de encontro dos habitantes da cidade e pudemos compartilhar com eles aqueles momentos de descontração.

A pizza com tudo dentro, mais refrigerante saiu por módicos R$ 32,00.

Artesanato é o maior barato


Uma das dicas que o pessoal da cidade nos deu foi conhecer a Associação dos Artesãos de Manuel Duarte e Porto das Flores, popularmente conhecido como Florart.

A sede da associação fica às margens da RJ-145 e é bem fácil de achar, pois ocupa uma ampla área numa antiga estação ferroviária.

A loja é muito bem organizada e alí é possível encontrar o resultado do trabalho de mais de 60 artesãos e artistas populares. São peças feitas com diversas técnicas, tais como cerâmica, tecelagem manual, marcenaria e a especialidade da casa: trançados em taboa - folha com a qual são feitos cestos e outros itens de decoração.

D. Linéia e D. Renata trocando idéias sobre decoração.

Bruxinhas de cerâmica, trabalho de artesão local.

Pousada Vila Flor


Está localizada bem em frente da praça principal, no coração da cidade. Originalmente era uma residência que a Sra. Margareth decidiu transformar em pousada. O quarto em que ficamos não era muito grande, mas atendeu as nossas necessidades de espaço. Cama confortável, banheiro espaçoso, com chuveiro elétrico. As instalações são novas e em boas condições. Embora houvesse um reforçador de sinal no quarto a qualidade do wi-fi deixou um pouco a desejar. A conexão funcionava melhor na área onde é servido o café da manhã.

O atendimento foi nota dez pela simpatia e atenção com os quais a Sra. Margareth nos recebeu, bem como pelas dicas sobre a cidade e sua história.

Estabelecimentos citados nesse artigo


Alambique Vieria & Castro
Estrada Fazenda União, 4477
Telefone: 24 99939-0714
Contato: Sra. Aline

Fazenda Santo Inácio
Rua Professora Enaura Reis Valle, s/n - a entrada fica ao lado do portal da cidade
Telefone: (24) 2458-1996
Aberto aos domingos a partir das 12:30h - de segunda a sábado é preciso agendar
Contato direto com os proprietários, Sr. Celso e sua filha Ana Célia

Florart
Rua Major Belford, s/n - Manuel Duarte
Telefone: (24) 2458-0190
Contato com Sra. Linéia

Pousada Vila Flor
Praça Cel. Sucena, 40
Centro
Telefone: (24) 2458-1114
Contato direto com a proprietária, a Sra. Margareth

Restaurante da Paulinha
Rua Santa Teresa D'Ávila, 70
Telefone: 24 24581000 - faz tele entrega